Tema debatido pela Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás ganha destaque com a publicação do Provimento nº 123/2024 e é detalhado pela presidente da Arpen/GO, Evelyn Valente
A doação de corpos para fins de ensino e pesquisa científica ainda é pouco conhecida pela sociedade, mas tem grande relevância para a área da saúde e para o meio acadêmico. Trata-se de um procedimento regulamentado que permite a utilização do corpo humano, após o falecimento, em atividades de estudo, pesquisa e formação prática de profissionais da medicina e de outras áreas da saúde.
Em Goiás, o tema ganhou destaque após ser debatido pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado em diferentes ocasiões, incluindo uma live e uma palestra voltadas à sociedade e aos profissionais da atividade extrajudicial. Com a publicação do Provimento nº 123/2024, a manifestação de vontade passou a poder ser registrada diretamente em cartório, sem necessidade de autorização judicial. Esse avanço fortalece o ensino médico e amplia as possibilidades de pesquisa científica no estado e em todo o país.
Para esclarecer os principais pontos sobre o tema e os impactos da regulamentação, conversamos com a presidente da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais de Goiás (Arpen/GO), Evelyn Valente. Na entrevista, ela detalha como o procedimento funciona, seus objetivos, as diferenças em relação à doação de órgãos para transplante e o papel dos cartórios de Registro Civil na formalização desse ato.
Confira a entrevista na íntegra:
ARPEN/GO: O que significa, na prática, a doação de corpos para fins científicos e acadêmicos?
Evelyn Valente: É o ato através do qual a pessoa manifesta, em vida, seu desejo de dispor do seu corpo para pesquisa e estudos científicos, após o seu falecimento. A formalização desta manifestação de vontade pode ser feita, em vida, pelo próprio doador ou, não havendo a manifestação em vida do doador, por autorização dos familiares (cônjuge, companheiro(a) ou parente até o 2º grau).
ARPEN/GO: Quais são os principais objetivos desse tipo de doação e de que forma ela contribui para a formação de médicos e profissionais da saúde?
Evelyn Valente: Um dos principais objetivos desta doação é contribuir para o avanço da ciência, pesquisas e estudos científicos, bem como, para a formação e melhor capacitação técnica dos profissionais das áreas da saúde.
ARPEN/GO: Qual é a diferença entre a doação de órgãos para transplante e a doação de corpos para estudo científico?
Evelyn Valente: A doação de órgãos ocorre após o diagnóstico de morte encefálica ou morte natural e tem como finalidade salvar vidas, beneficiando pacientes que aguardam um transplante. Já a doação de corpos para estudo científico destina-se ao avanço da ciência, por meio de pesquisas, ensino e aprimoramento da formação técnica de profissionais da saúde. Inclusive, a doação de órgãos para transplante é sempre prioritária, prevalecendo sobre a doação do corpo para fins acadêmicos e científicos.
ARPEN/GO: Como a doação de corpos pode impactar o avanço das pesquisas médicas e o desenvolvimento de novas técnicas de ensino na área da saúde?
Evelyn Valente: Este gesto é uma forma nobre de contribuir e impactar o avanço de pesquisas, novas técnicas e estudos científicos como, por exemplo, estudos anatômicos de forma prática e real, treinamento e desenvolvimento de habilidades e capacitação dos profissionais, além de contribuir para uma formação ética e humanística. Esta doação, também, contribui e impacta a qualidade e eficiência do atendimento de saúde da população, pois proporciona formação de médicos mais capacitados, desenvolvimento de novas técnicas e tratamentos, além de espelhar e inspirar com este ato de generosidade valores como empatia e respeito à vida e ao corpo humano.
ARPEN/GO: Acredita que a ampliação desse tipo de doação pode transformar a realidade das faculdades de medicina no Brasil, especialmente em Goiás?
Evelyn Valente: A ampliação deste tipo de doação pode contribuir muito com uma formação médica prática e segura, impulsionando também a pesquisa científica, tornando a realidade das faculdades de medicina mais completa, moderna e humanizada, formando um sistema de saúde mais forte para toda sociedade.
ARPEN/GO: Qual é o papel dos cartórios de registro civil na formalização da doação de corpos para fins científicos e acadêmicos?
Evelyn Valente: Os cartórios de registro civil de pessoas naturais têm um papel fundamental na formalização e cumprimento da vontade do doador. Essa manifestação pode ocorrer tanto em vida, pelo próprio interessado, quanto por suprimento familiar, sendo possível sua formalização por diferentes instrumentos: Termo com assinatura eletrônica (IdRC) ou com firma reconhecida; Escritura Pública Declaratória; ou, ainda, por ato judicial.
ARPEN/GO: O Provimento nº 123/2024 da CGJGO, que permite esse ato diretamente em cartório, quais avanços a senhora enxerga em termos de agilidade e acessibilidade para os cidadãos?
Evelyn Valente: Com a publicação do provimento, houve um avanço na celeridade e efetividade do procedimento, pois o respectivo normativo dispensou a necessidade de autorização judicial para este, que passou a ser feito diretamente nos cartórios.
Além disso, humanizou o procedimento trazendo a obrigatoriedade de, após finalizado o estudo, haver uma comunicação com a família para manifestação no interesse de realizar funeral, cremação ou sepultamento do corpo.
ARPEN/GO: Como a Arpen/GO pretende atuar junto à sociedade para ampliar o conhecimento sobre essa possibilidade?
Evelyn Valente: É importante conferir ampla divulgação destas informações à sociedade e aos registradores civis para que essas pessoas que desejam fazer a doação, saibam da forma e possibilidades de fazê-la, bem como para que os registradores civis possam atender de forma eficiente esta demanda.
Assim, além da ampla divulgação do provimento, a cartilha informativa desenvolvida pela COGEX também será enviada a todos os registradores civis e, ainda, já foram realizados eventos e lives sobre este tema em parceria com o TJGO.
Por Camila Braunas. Assessora de Comunicação da ARPEN/GO.