Casar é Planejar: o novo olhar dos goianos sobre o casamento civil

Em entrevista exclusiva à ARPEN/GO, o advogado Christiano de Lima e Silva Melo, presidente da Comissão de Direito das Famílias da OAB/GO e membro do IBDFAM, fala sobre a valorização do casamento civil em Goiás, as mudanças de comportamento da sociedade e o papel dos cartórios na promoção da segurança jurídica e da cidadania

Nos últimos anos, o casamento civil voltou a ocupar um espaço de destaque na vida dos goianos. Longe de ser apenas uma formalidade, o ato de oficializar a união perante o cartório tem ganhado novas camadas de significado. Após o período de isolamento provocado pela pandemia, muitos casais passaram a enxergar o valor da estabilidade, do planejamento e da construção de um futuro compartilhado. Nesse contexto, o casamento civil surge não apenas como uma celebração do amor, mas também como uma escolha consciente por segurança jurídica, organização patrimonial e fortalecimento dos laços familiares.

Acompanhando essa transformação social, os cartórios de Registro Civil têm exercido papel essencial como facilitadores do processo e guardiões da legalidade. A modernização tecnológica e a atuação orientadora dos registradores tornaram o procedimento mais acessível, rápido e transparente. Além disso, o reconhecimento de casamentos homoafetivos, assegurado pela Resolução nº 175 do CNJ, ampliou o alcance da cidadania e consolidou o casamento civil como um instrumento de inclusão e igualdade. Mais do que nunca, o ato de casar reflete uma sociedade que valoriza o afeto estruturado e a responsabilidade compartilhada.

Para aprofundar essa discussão, a ARPEN/GO conversou com Christiano de Lima e Silva Melo, advogado especialista em Direito das Famílias e Sucessões, presidente da Comissão de Direito das Famílias da OAB/GO e membro do IBDFAM. Na entrevista a seguir, ele analisa as mudanças de comportamento em torno da formalização das uniões, a importância da segurança jurídica proporcionada pelo casamento civil e o papel decisivo dos cartórios e dos profissionais do Direito na construção de relacionamentos mais sólidos e conscientes.

Confira na íntegra:

ARPEN/GO: Nos últimos anos, os números de casamentos civis em Goiás têm crescido?

A experiência da pandemia nos levou a reflexões a respeito das prioridades: vínculos estáveis, planejamento e pertencimento voltaram ao centro. O casamento civil, enquanto rito público e contrato jurídico, voltou a ter prioridade para uma significativa parcela da população. À medida que a economia regional retomou fôlego, casais se sentiram mais seguros para projetar futuro, constituir patrimônio e, consequentemente, formalizar a união. Some-se a isso a maior inclusão de casamentos homoafetivos plenamente assegurados pela Resolução CNJ 175/2013 —, a capilaridade dos cartórios e a simplificação tecnológica que reduziram custos de transação, tornaram o processo mais célere e prático. Há também um fator de maturidade social: cresceu a compreensão de que “amor não dispensa contrato”; ao contrário, acordos claros reduzem ansiedade, protegem projetos de vida e preservam a dignidade das pessoas quando surgem crises. O extrajudicial, com sua vocação de prevenir e pacificar, opera aqui como uma política pública silenciosa de estabilidade social.

ARPEN/GO: É possível dizer que há uma mudança de comportamento da sociedade em relação à formalização das uniões?

Sim, e essa mudança é qualitativa. Houve uma transição do “vamos ver no que dá” para o “vamos planejar”. A união estável segue relevante, mas muitos casais passaram a enxergá-la como etapa ou alternativa, não como substituto do casamento civil. A razão é simples: o casamento confere um pacote de certezas patrimoniais, sucessórias e parentais. Em termos sociológicos, formalizar a união virou um ato de cuidado: registrar a promessa, ajustar expectativas, pactuar regras e, com isso, reduzir o espaço do conflito. A boa notícia é que essa mudança não é só normativa; é cultural. Pessoas jovens, casais com filhos de relações anteriores e casais homoafetivos buscam o cartório para escrever um roteiro claro de vida comum. A estrutura extrajudicial, mais acessível e orientadora, tem sido decisiva para transformar esse desejo em prática segura.

ARPEN/GO: Como o casamento civil contribui para a segurança jurídica do casal?

Contribui por três vias complementares. Primeiro, estabelece estado civil e publicidade registral. Segundo, cria uma matriz patrimonial verificável. Terceiro, confere previsibilidade sucessória e familiar. Na prática, o casamento civil funciona como um “manual mínimo” de proteção mútua, sobre o qual o casal pode construir camadas adicionais por meio de pacto antenupcial e outros acordos. O resultado é segurança emocional: quando as regras são claras, o vínculo fica mais leve, porque os medos difusos dão lugar a compromissos explícitos. Se houver pacto antenupcial, a proteção e a organização matrimonial certamente serão fortalecidas.

ARPEN/GO: Qual é o papel do cartório de Registro Civil no processo do casamento?

O cartório é uma espécie de guardião da legalidade e o facilitador do rito. Conduz a habilitação, agenda e celebra a cerimônia e, ao final, registra o ato, conferindo fé pública e publicidade. Em termos práticos, o cartório exerce um papel pedagógico: orienta, traduz a lei em passos simples, e acolhe dúvidas que, se negligenciadas, virariam conflitos.

ARPEN/GO: Como os cartórios garantem a legalidade e a segurança dos casamentos realizados?

A segurança nasce da qualificação registral, da checagem de documentação, certidões, da publicidade dos atos e da capacidade para o cidadão exercer ato A ou B. No plano tecnológico temos visto a implementação de diversos mecanismos para dar maior segurança as relações. utilizando selos digitais, QR codes de autenticidade, sistemas interligados e outros. É importante frisar que existe ainda o controle externo: correições periódicas, fiscalização do Judiciário e normas da Corregedoria. Resultado: baixo índice de nulidades, rastreabilidade do ato e alta confiabilidade social.

ARPEN/GO: Na sua visão, o que representa o casamento civil como ato de cidadania?

É um exercício de liberdade responsável. O casamento civil é, ao mesmo tempo, celebração afetiva e contrato público que gera efeitos perante a sociedade. Como ato de cidadania, ele afirma igualdade, reforça a autonomia privada, em especial devido a possibilidade do casal escolher o regime de bens, estipular regras e outros.  No plano simbólico, materializa a ideia de que o amor merece estrutura e proteção. Já no plano social, é um mecanismo de organização do cuidado e de distribuição de responsabilidades. Quando casais planejam e registram sua união, não estão apenas “assumindo” um compromisso; estão contribuindo para uma sociedade com menos litígios, menos vulnerabilidades e mais previsibilidade.

ARPEN/GO: Quais avanços tecnológicos ou normativos facilitaram o processo de habilitação e celebração do casamento em cartório nos últimos anos?

Percebo nítidos avanços em três frentes, a digital, a maior conexão entre os cartórios e os avanços das normas propostas pelo CNJ. Prova disso são os recentes provimentos do CNJ e das Corregedorias locais consolidaram práticas mais simples e seguras. O e-Notariado facilitou a confecção do pacto antenupcial por videoconferência e assinatura digital qualificada, quando permitido. Definitivamente a tecnologia serve à missão social do extrajudicial.

ARPEN/GO: Quais são os principais direitos e deveres que passam a valer a partir do casamento civil?

O casamento estabelece deveres de respeito, assistência e cooperação, e disciplina o projeto parental. No âmbito patrimonial, define-se um regime de bens que regerá a comunicação ou não dos aquestos; isso tem impactos em meação, administração de bens, dívidas e partilha. No campo sucessório, o cônjuge adquire direitos específicos na herança, conforme o regime de bens. Há de se falar também dos direitos previdenciários e de assistência em saúde, além de facilidades probatórias. Um ponto que foi recentemente reafirmado pelo STJ é o dever de fidelidade.

ARPEN/GO: Quais cuidados os casais devem ter ao escolher o regime de bens?

O primeiro cuidado e primordial, consultar um Advogado Especialista em Direito das Famílias e Sucessões. Após a escolha do advogado, o mesmo deverá analisar o perfil dos clientes para que juntos possam elaborar um pacto antenupcial que contemple as necessidades do casal. A escolha do regime de bens poderá ser um marco tanto positivo, quanto negativo, pois uma escolha sem orientação profissional poderá acarretar inúmeras consequências danosas.  O pacto antenupcial lavrado em Tabelionato de Notas e averbado é o instrumento adequado para personalizar regras (inclusive cláusulas de administração patrimonial, proteção de quotas empresariais e pactos de convivência). Uma coisa é certa, a decisão madura aqui evita litígios amanhã — e dá paz hoje.

ARPEN/GO: O senhor acredita que a maior divulgação de informações sobre os regimes de bens e a atuação dos cartórios tem incentivado as pessoas a formalizarem o casamento?

Acredito que toda informação nessa área é importantíssima, entretanto, creio que sejam necessárias ações em conjunto com a OAB, para ampliar o alcance. Quando os cartórios e os profissionais do Direito explicam, com linguagem clara, as diferenças entre os regimes, o que é pacto antenupcial, como funciona a meação e quais são os efeitos sucessórios, o casamento deixa de parecer uma “caixa preta” e se transforma em um projeto controlável. No fim, o que convence não é o jargão jurídico; é mostrar que um bom contrato protege afetos e patrimônios de modo justo.

ARPEN/GO: Como o senhor enxerga a importância da atuação conjunta entre os cartórios e os profissionais do Direito para orientar melhor os casais?

Vejo como uma parceria essencial e complementar. O cartório garante a legalidade, a fé pública e a execução segura do procedimento; o advogado traduz a vida do casal em cláusulas e escolhas, personalizando o que a lei oferece de forma mais clara e objetiva. Quando trabalhamos juntos, o casal atravessa o processo com clareza, rapidez e segurança. O resultado dessa engrenagem é sociologicamente valioso: menos judicialização, menos rupturas traumáticas, mais previsibilidade para filhos e para o patrimônio familiar.

ARPEN/GO: Que mensagem deixaria aos casais que estão planejando oficializar a união no civil?

Celebrem o amor com toda intensidade possível, mas jamais negligenciem na estruturação de um pacto antenupcial que seja justo. Procurem o advogado da sua confiança, elaborem um pacto coeso. O casamento civil não é apenas um rito; é um compromisso público e um projeto de longo prazo que protege sonhos, pessoas e patrimônio. O extrajudicial é o facilitador dessa jornada. Que a formalização seja o primeiro ato de uma vida a dois em que afeto e responsabilidade caminham juntos. Que Deus abençoe a todos!


Por Camila Braunas, Assessora de Comunicação da ARPEN/GO.

Fale Conosco

Horário de funcionamento
Segunda à Sexta: 8h às 18h

Rua 3, nº 1022, Ed. West Office, Sala 1402, Setor Oeste. Goiânia – GO

Fique por dentro

Fale Conosco

Horário de funcionamento
Segunda à Sexta: 8h às 18h

Rua 3, nº 1022, Ed. West Office, Sala 1402, Setor Oeste. Goiânia – GO

Fique por dentro

Todos os direitos reservados | Desenvolvido por Palú Comunica

TABELA XVI

ATOS DOS OFICIAIS DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E DE INTERDIÇÕES E TUTELAS ANO 2022

2993